- por André Gutemberg
De 2014 pra cá presenciamos em nossa sociedade um avanço
assustador do Fascismo. Na verdade, a intensificação de atitudes hostis da
classe média e alta contra culturas periféricas é sempre esperado - pois é um
ciclo – o que realmente chocou as mentes mais livres de nossas comunidades, foi
o fato de pessoas, que até então, convivendo num circulo subversivo e progressista,
se deixaram levar pela covardia propagada por políticos sem sensibilidade social
alguma. Assim, por ignorância e medo (Ou apenas ódio burro mesmo), tais “cidadãos
de bem” começaram reproduzir falas reacionárias dentro de meios especificamente
“Revolucionários”; um desses meios é o Hip-Hop, que jamais poderá ser
desvinculado da pixação.
E se você tá se perguntando que caralhos tem a ver fascismo,
Hip-Hop e pixação, calma que eu explico.
Ano passado o prefeito da cidade de São Paulo, João Dória
declarou guerra contra os pixadores promovendo um imenso banho de cinza nos
muros. A polêmica ação da prefeitura, gerou debates em várias camadas sociais,
das universidades até as favelas, e é claro o que Hip-Hop como cultura que tem
uma filosofia de vida gestada especificamente nas ruas, não poderia estar de
fora, já que também, a grande afirmação usada por Dória como parâmetro (para
apagar os pixos sem parecer um grande vilão) foi a de que o “Graffiti é arte, o
pixo não”. E como todos sabem (ou deveriam) o Graffiti é um dos 4 principais
elementos do Hip-Hop. Mas e o Pixo?
Foi a partir desse ponto que presenciamos os tais “Fãs de
Rap” se perderem dentro do contexto do gênero musical que dizem amar.
Com a tão sonhada expansão do Rap dentro do cenário musical
brasileiro, e o rápido crescimento do seu público vieram de brindes alguns
probleminhas básicos. Um deles é a falta de consciência de que o Rap (assim
como o Graffiti) é um dos elementos de uma cultura que carrega um viés político
libertário muito forte: Hip-Hop é o seu nome. Logo, se o Rap for desassociado
da sua própria Cultura vamos ter distorções por parte de quem o faz, e
consequentemente por parte de quem o escuta, tornando dessa forma expressões
conservadoras (e idiotas) como “Graffiti é arte, Pixo não”, cada vez mais
corriqueiras nos círculos de Rap.
Tá, mas e o Pixo? Bom, eu não queira responder essa
pergunta, porque a questão principal é: um autêntico “Fã de Rap” deveria saber
que o Pixo nada mais é que uma vertente do Graffiti. O Parágrafo anterior
resume de fato sobre do que se trata esse texto: Falta de conhecimento dos “Fãs
de Rap”, e de quem se diz parte da Cultura Hip-Hop, sobre o próprio Rap e
Hip-Hop.
Mas pra não ser injusto com quem tá chegando agora no mundo
do Ritmo e Poesia, vou explicar bem rapidamente a fita da pixação no Brasil.
O Graffiti nasceu nos EUA por meados dos anos 60/70, no contexto
das gangues, violência etc e tal (Nasceu nessa data na estética como o
entendemos contemporaneamente, pois há aqueles que vão dizer que as pinturas
rupestres dos tempos da caverna são Graffiti). Desde o inicio sofrendo
repressão por parte das autoridades, o alvo principal dos primeiros grafiteiros
- considerados inimigos do Estado - eram prédios e os trens que cortavam os
subúrbios. Evoluindo até chegar nas exposições de arte renomadas com Basquiat e
Fred Fab Five, o Graffiti criou várias vertentes e atualmente habita museus e
salões chiques do mais alto escalão. Mas não é porque o Graffiti saiu do gueto
- pra tomar o dinheiro desses branquelos ricos, que não sabem nada da rua – que
o gueto saiu do Graffiti. As vertentes mais vandalistas como o Bombing, o Throw-up
e a Tag caminham lado a lado, e nunca deixaram de existir nos muros das mais
diversas cidades mundo a fora. “Tá maaas e o pixo carai?? Na “Grande Wikipédia”
não tem nada de Pixo como vertente do Graffiti.” Hehe não priemos canico...
Usando a própria Wikipédia, podemos notar as semelhanças
entre as vertentes ilegais do Graffiti e a Pixação Brasileira. Lógico que o
Graffiti sendo uma arte orgânica onde quer que aconteça vai levar em conta as
peculiaridades da cultura local, como o Brasil é um país muito singular temos
nossas vertentes únicas de Graffiti como o Pixo em SP, e o Xarpi no RJ. Não vou
me aprofundar nesse tema, sobre as características do Pixo e do Xarpi, fica pra
um outro texto, mas apenas com essas poucas informações dadas, percebemos ser
inegável que a ignorância do senso comum brasileiro é grande quando se trata
desse assunto. O único lugar do mundo em que o Graffiti não é associado ao
vandalismo é o Brasil, pros gringos a
palavra “pichação” nem existe. Pros lados de lá, qualquer escrita nos muros com
a estética urbana moderna é considerada Graffiti.
Quando se tem esse conhecimento, soa muito imbecil frases do
tipo; “Graffiti é arte, pixação é apenas sujeira.” Me causa raiva profunda. Mas
a minha raiva não provem do fato de ouvir gente como Dória dizendo isso, esse
tipo de gente “é acostumada à galerias de arte particulares, é criada
rodeada por Portinaris e Picassos e cujo único contato pessoal com os reles
mortais da periferia são provavelmente seus serviçais. Dória apresenta uma visão
simplista e cega do que é o Pixo, mostrando que não consegue compreender a
subjetividade das identidades periféricas da cidade que administra.” O que me
causa espanto é aquilo que foi dito no primeiro parágrafo: pessoas que fazem
parte de um meio progressista (Como o Hip-hop) – tipo “Fãs De Rap” –
reproduzindo falas do opressor, o mesmo que se pudesse baniria do mundo a
cultura e o gênero musical que o esse tal “Fã” ama. Mas como diz o poeta: “Fãs
de Rap são tão burros.”
Um desses muitos episódios que me chocou em 2017 foi quando
o renomado Mc Rashid publicou em sua
página no faceboock uma foto em apoio ao
Pixo. A quantidade de gente que não sabe nada sobre a cultura que diz fazer
parte é grande.
E antes que você termine esse texto sem entender o porquê de
voltar a esses acontecimentos, e onde se encaixa o fascismo nessa história
toda, é preciso lembrar que 2018 é ano de eleição e ainda temos muitos
“políticos ridículos (Neofascistas como João Dória) sendo chamados de mito” por
gente que curte Rap. E se ano passado foi conturbado esse ano será mais ainda.
É importante não perder de vista atitudes infantis como a do
Dória de declarar guerra contra Pixação, pra que não que esqueçamos quem é o
nosso inimigo. O fascismo tem como característica: “A perseguição sem julgamento,
campos de trabalho e autoritarismo não só vieram na prática muito antes do genocídio
e da guerra, mas também já estavam em suas palavras muito antes de acontecerem.
No discurso e na prática, a sociedade é (ou destina-se) apenas para aqueles que
o fascista identifica como adequados; há um evidente elitismo e senso de
pertencimento “correto” e “verdadeiro”, seja uma concepção de nação ou de
identidade de raça ou grupo. E essa identidade “verdadeira” será estabelecida à
força se preciso.”
Tendo isso em mente, fica mais evidente ainda por que esses
caras odeiam tanto o Pixo. É porque ele carrega consigo a essência do Hip-Hop.
E Hip-Hop é sobre não se enquadrar em sistemas, subversão, revolução, por todas
as verdades a prova, conviver bem com o diferente; “Paz, amor, união e
diversão”.
Então, meus manos e manas, toda vez que vocês ouvirem alguém
(que se diz do Rap) falando algo do tipo; “Graffiti é legal, Pixo é feio”,
mostre esse texto pra ele, e se ele insistir nas ideias retrógadas, tenha
certeza que esse é o mesmo que taxa de vitimismo as lutas das minorias, é o
mesmo que faz piada racista afirmando: “o primo do cunhado do meu genro é
mestiço, o racismo não existe”, esse é o mesmo que chama de vadia a mina que
frequenta balada e curte sexo casual, esse é o mesmo que diz que Rap não tem
cor, esse é o mesmo que chama de comunismo consciência social, esse é o mesmo
que xinga o Don L e o Diomedes nos comentários do youtube, esse é o mesmo que
vota em Bolsonaro! Talvez tenha sido baseado nesse tipo de “Fã de Rap” que Sant
escreveu: “Muitos dizem mas não são...” e o Criolo também: “Uns acham que são,
mas nunca vão ser...”
Viva Graffiti, viva a Pixação, viva o Rap, viva o Hip-Hop,
viva a arte!!
Referências:
Hip-Hop Genealogia -
Andy Jankovski - A pixação não é arte. E não é para ser
Leandro Dias - Fascismo à Brasileira
Máfia 44 documentário 2009
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